Em entrevista à AgĂȘncia Brasil, a professora da FGV Direito de São Paulo acredita que o Supremo Tribunal Federal (STF) deve considerar inconstitucional o PL da Anistia, caso ele seja aprovado pelo Congresso Nacional.
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"Apesar de não haver expressa menção sobre vedação desse tipo de anistia na Constituição, hĂĄ um argumento de que, por coerĂȘncia interna da Constituição, tais crimes seriam impassĂveis de anistia. Assim entendeu o ministro Dias Toffoli [do Supremo Tribunal Federal] ao julgar a inconstitucionalidade da concessão de graça ao ex-deputado Daniel Silveira", explica a jurista.
O ex-deputado Daniel Silveira foi condenado a mais de 8 anos de prisão por atentar contra o regime democrĂĄtico. Ao anular a anistia concedida a Daniel Silveira pelo ex-presidente Jair Bolsonaro, em 2022, o ministro Dias Toffoli afirmou na sentença não vislumbrar "coerĂȘncia interna em ordenamento jurĂdico-constitucional que, a par de impedir a prescrição de crimes contra a ordem constitucional e o estado democrĂĄtico de direito, possibilita o perdão constitucional aos que forem condenados por tais crimes. Pergunto: que interesse pĂșblico haveria em perdoar aquele que foi devidamente condenado por atentar contra a própria existĂȘncia do estado democrĂĄtico, de suas instituições e institutos mais caros?".
A Constituição, no artigo 5ÂȘ, diz que não podem ser objeto de anistia os condenados por tortura, trĂĄfico de drogas, terrorismo e crimes hediondos. O argumento de Dias Toffoli diz que "por coerĂȘncia interna" da Constituição essa vedação tambĂ©m deve ser atribuĂda aos crimes contra a ordem democrĂĄtica.
O PL da Anistia tambĂ©m seria inconstitucional por violar a separação e a independĂȘncia entre os Poderes uma vez que o Congresso Nacional estaria invadindo uma competĂȘncia que Ă© do JudiciĂĄrio, segundo avaliação da jurista Tânia Maria de Oliveira, da Associação Brasileira de Juristas pela Democracia (ABJD).
"Essas pessoas estão sendo processadas e julgadas no STF. Se o Congresso resolver dar anistia a essas pessoas, ele estĂĄ claramente fazendo uma invasão de uma competĂȘncia que Ă© do Supremo", explicou.
Tânia Oliveira considera que esses parlamentares usam os instrumentos da democracia para uma briga que não Ă© jurĂdica, mas sim polĂtica. "Querem anistia àqueles que atacaram o próprio Parlamento. Virou um debate que Ă© estritamente polĂtico, não Ă© um debate jurĂdico. Eles querem anistiar estritamente por uma posição polĂtica", acrescentou.
Pacificação
No parecer favorĂĄvel à anistia, o relator da matĂ©ria na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados, deputado Rodrigo Valadares (União/SE), diz que a medida visa a "pacificação" do paĂs e que "a polarização polĂtica pode levar um paĂs a uma guerra civil quando as tentativas de apaziguamento são deixadas de lado".
O cientista polĂtico João Feres JĂșnior, professor do Instituto de Estudos Sociais e PolĂticos da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Iesp-Uerj), considera que o projeto deve ter o efeito contrĂĄrio ao anunciado pelo relator.
"A libertação dos radicais presos não vai causar qualquer pacificação. Muito pelo contrĂĄrio, vai sinalizar que Ă© possĂvel atacar as instituições de maneira violenta e sair incólume", diz.
Para o especialista, a tentativa de anistiar os responsĂĄveis pelo 8 de janeiro revela certo desespero dos atores polĂticos por trĂĄs do movimento que questionou, sem provas, o resultado da eleição presidencial de 2022.
"Os parlamentares bolsonaristas estão meio desesperados. Eles estão se aferrando ao que podem. Essa agenda da anistia Ă© bem limitada. Apenas querem livrar a cara de quem se envolveu na tentativa de golpe. Se vocĂȘ não consegue fazer um apelo para um eleitorado maior, então vocĂȘ tem um problema", analisa.
Crime
Outro argumento usado pelo relator do PL da Anistia, Ă© de que não houve crime contra a democracia, apenas a depredação do patrimônio pĂșblico e que aquelas pessoas "não souberam naquele momento expressar seu anseio".
A jurista EloĂsa Machado de Almeida acredita que essa Ă© uma tentativa de se reescrever a História e que as investigações em curso no STF são robustas em relação ao que aconteceu antes e durante o dia 8 de janeiro.
"Os argumentos querem fazer crer que não houve crime, mas sim uma mera manifestação de expressão. Isso estĂĄ em total desacordo com os fatos revelados nas investigações e nas ações penais, onde se viu uma estrutura voltada à prĂĄtica de crimes contra as instituições democrĂĄticas, inclusive com a participação da alta cĂșpula da PresidĂȘncia da RepĂșblica, deputados e populares", afirma.
No Brasil, Ă© crime tentar depor, por meio da violĂȘncia ou de grave ameaça, o governo legitimamente constituĂdo ou impedir e restringir o exercĂcio dos poderes constitucionais, conforme define a Lei 14.197/2021. Essa legislação tambĂ©m considera crime incitar, publicamente, a animosidade entre as Forças Armadas e os demais poderes constitucionais. As penas variam e podem chegar a 12 anos de cadeia.
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