Os dados estão no Monitor da ViolĂȘncia PolĂtica de GĂȘnero e Raça, do Instituto Alziras."Nenhum processo ainda tinha transitado em julgado (não tinha percorrido todas as instâncias de julgamento). Então, a gente vĂȘ que hĂĄ uma morosidade do próprio sistema de justiça em poder apurar, de fato, os casos e fazer a devida responsabilização dos atores", diz a pesquisadora.
Entre os casos analisados, todas as vĂtimas das ações penais ajuizadas eram mulheres eleitas, enquanto 92% dos acusados eram homens, dos quais 62% eram brancos. AlĂ©m disso, metade dos episódios de violĂȘncia ocorreu em ambiente parlamentar. "Isso chamou a nossa atenção: os casos que avançaram no sistema de justiça foram exclusivamente os casos de mulheres que jĂĄ tinham mandato. Os processos das candidatas acabam tendo mais lentidão", alertou a diretora do Instituto Alziras. Michelle Ferreti entende que os dados sugerem que a lei tem sido menos eficaz na proteção dessas mulheres sem mandato e, por isso, menos protegidas.
Michelle Ferreti argumenta que o problema relaciona-se com a dificuldade do acesso à justiça e que os casos que evoluem são de mulheres com mandato e em sua maioria (53%) de brancas. "O que tambĂ©m nos sugere que as mulheres negras, alĂ©m de serem o maior grupo populacional do paĂs, são as que sofrem as mais graves ameaças e são vĂtimas dos mais graves casos de violĂȘncia polĂtica de gĂȘnero e raça".
Outro alerta trazido pela pesquisadora Ă© que haveria uma parcela importante de subnotificação dos casos de violĂȘncia polĂtica de gĂȘnero e raça no Brasil. "As pessoas não sabem onde e como denunciar, seja porque elas tambĂ©m tĂȘm medo de fazer denĂșncia ou porque tĂȘm medo de retaliação", pondera.
Mais um problema Ă© que, dentre as notificações ao MinistĂ©rio PĂșblico, haveria ainda um problema sobre a compreensão da lei pelos próprios atores e do sistema de justiça. "Muitos casos acabam saindo da esfera eleitoral e indo para a esfera civil porque são tratados como injĂșria ou difamação, e os crimes de violĂȘncia polĂtica de gĂȘnero acabam sendo classificados de outra forma", exemplifica.
O estudo identifica que no Brasil hĂĄ uma cultura polĂtica de muita violĂȘncia, sexista e racista, contra mulheres nos espaços de poder e tomada de decisão. "A gente tambĂ©m viu que em 30% dos casos essas violĂȘncias se deram de forma virtual", diz Michelle Ferreti. Para ela, a violĂȘncia polĂtica Ă© crime contra a democracia, jĂĄ que haveria tentativa de silenciamento e interdição no debate. "A gente tem feito um esforço de reduzir essa subnotificação e, por outro lado, tentar avançar no sentido de fazer a formação dos atores para que haja uma apuração e uma responsabilização mais eficazes de possĂveis acusados desse crime".
Para denunciar casos de violĂȘncia polĂtica, o MinistĂ©rio PĂșblico Federal e o próprio Instituto Alziras (telefone 61.3771-1071) disponibilizam canais de denĂșncias.